Rir para não chorar

Inacreditável como somos capazes de humorizar a própria tragédia. Tanto na política quanto na economia, assim como nos esportes (na histórica derrota de 7 a 1 para a Alemanha) e em relação às principais notícias dos jornais, tudo vira piada nos labios desse povo.

Pois bem. Por esses dias de festa coletiva, recebi pelo Whatsapp umas paródias envolvendo quatro tradicionais marchinhas de Carnaval que logo fui compartilhar em minhas redes sociais pelo telefone móvel celular. A primeira delas, baseada em Cachaça não é água, escrita em 1953 por Mirabeau Pinheiro, Lúcio de Castro e Heber Lobato, zomba da empreiteira Odebrecht por sua distribuição de propinas a políticos do país, como se lê a seguir:

"Se você pensa que dinheiro é água.
Dinheiro não é água não.
Dinheiro vem da Odebrecht.
E água vem do ribeirão."

Outra que me chamou a atenção por sua criatividade foi a versão inspirada em A Jardineira, a qual foi composta no começo do século passado por Humberto Porto e Benedito Lacerda, mas que se tornou célebre pela voz de Orlando Silva, este considerado o "cantor das multidões". Em sua crítica, o autor parodial se refere aos desvios dos recursos da estatal Petrobras através dos esquemas criminosos praticados nos contratos onde um percentual era pactuado para a ilicitude:

"O petroleira por que estás tão triste?
Mas o que foi que te aconteceu?
Foi a propina que caiu no grampo,
Deu dois por cento
E depois morreu."

A terceira paródia, baseada na politicamente incorreta Cabeleira do Zezé, feita por João Roberto Kelly, na década de 60, foi direcionada ao ex-governador do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, o qual se acha preso desde o ano passado em Bangu 8. Só que, pelo fato dos detentos serem obrigados a ter os cabelos cortados nos estabelecimentos penais e de custódia, o criativo humorista apenas poderia ridicularizar a careca do réu:

"Olha a cabeça do Cabral.
Será que ele é?
Será que ele é?
Marginal?"

A última que li, também do Kelly, inspirou-se em Maria Sapatao, outra música inapropriada para a nossa época onde tudo cheira a preconceito mas que, nos anos 80, o saudoso Chacrinha costumava cantar em seu divertido programa de TV que ía ao ar nas tardes de sábado. Contudo, o crítico da política trocou o sinônimo vulgar de lésbica para "delação", que seria um nome coloquial para o benefício jurídico da tão festejada colaboração premiada. Isto porque, graças à sua aplicação é que muitos delitos passaram a ser descobertos pelas autoridades de investigação, levando inúmeros políticos e empresários ricos para a cadeia como jamais se viu em toda a nossa história:

"Maria delação,
Delação, delação.
De dia, mordomia.
De noite, a prisão."

Como se vê, meus leitores, a situação no país pode estar uma calamidade nacional, com milhões de desempregados, mas ainda assim o brasileiro, em sua pacificidade passiva, consegue encontrar bons motivos para se alegrar (ou anestesiar-se) e não sentir o lado esquerdo do peito tão deprimido com as más notícias. Ou seja, o nosso povo tenta levar a vida na brincadeira e faz com que a tragédia, nesses três dias, vire um animado samba.

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