A camisa da seleção manchada de sangue





Por Hermes C. Fernandes

Contagem regressiva para a Copa. Imagino como deve estar o coração dos dirigentes desta nação. Como o povo reagirá nas ruas? Aliás, a julgar pelas últimas copas, nossas ruas já deveriam estar enfeitadas. Mas parece que nem o tatu bola, escolhido para ser o mascote desta copa, conseguiu entusiasmar a população. A propósito, não poderiam ter escolhido um mascote melhor. Nosso mascote encarna o desejo que temos de abrir um buraco no chão e nos esconder até que se passe a vergonha a que estamos sendo submetidos. Não tanto pelo nosso medíocre futebol que já foi considerado o melhor do mundo, mas, sobretudo, pelo show de incompetência de nossos governantes que usaram o dinheiro público para bancar um campeonato privado, construindo estádios superfaturados e adotando uma postura subserviente diante das exigências da FIFA.

E o tal legado que a Copa deixaria para o povo brasileiro? Só pode ser piada. Quem mora no Rio de Janeiro, por exemplo, sabe o caos em que a cidade foi mergulhada. As obras do BRT que visam beneficiar as empresas de ônibus que há muito controlam nossa cidade, deixaram-nos reféns do trânsito caótico. E não pensem que após sua 'conclusão' as coisas melhoraram. Algumas das principais vias dos bairros cortados pela transcarioca tiveram sua largura reduzida. Se já era difícil transitar ali, agora tornou-se quase impossível. Sem contar o péssimo acabamento das obras, as ruas que mal foram recapeadas e já estão esburacadas novamente. Às vezes desconfio que a prefeitura e o governo do estado tenham algum tipo de vínculo com as empresas de suspensão. Haja amortecedores para aguentar tantos buracos e quebra-molas (lombadas).

Porém, o que mais causa revolta na população são as condições precárias em que se encontram nossos hospitais e escolas.

Acabei de assistir a um vídeo postado no youtube onde uma jovem dá a luz em pleno corredor do hospital sem qualquer ajuda médica. A criança simplesmente despencou do seu ventre e por pouco não morreu na queda. Como líder de uma comunidade cristã, tenho presenciado o descaso dos nossos governantes cada vez que visito um hospital da rede pública. Mas senti na pele este descaso com a falecimento de minha sogra quando uma UPA se negou a disponibilizar uma ambulância para levá-la a um hospital. Casos como este são cada vez mais frequentes.

Se quisermos medir a seriedade de um governo, basta ver o tratamento que dispensa aos seus próprios filhos. Os parques de Orlando, por exemplo, oferecem aos moradores da Flórida um preço diferenciado daquele oferecido aos turistas. Enquanto morávamos lá, podíamos pagar bem menos que um turista para visitar a Disney ou qualquer outro parque. Aqui, nosso povo terá que assitir à Copa pela TV ou pagar uma considerável soma em dinheiro. Definitivamente, esta Copa não é nossa. É para os turistas. Como diz o adágio, é para inglês ver.

Enquanto eles se divertem, nossos velhos morrem nas filas dos hospitais. Nossas meninas se prostituem nas avenidas das grandes cidades. Nossos meninos são recrutados pelo tráfico. Nossos policiais são mortos por traficantes fortemente armados. E aqueles que assaltam os cofres públicos permanecem ilesos.

Sinceramente, nossos atletas deveriam se envergonhar de vestir a camisa canarinho. Ela está manchada com o sangue do povo brasileiro. Nossa pátria já não é a mãe gentil antes cantada com orgulho nos quartéis e pátios de escolas. Nosso patriotismo se esgota ante a sujeira que agora varrem para debaixo do tapete verde dos estádios.

Se vou torcer pelo Brasil? Estou tentando me animar, mas está difícil. Me patriotismo está sendo posto à prova. Não se trata de abraçar a uma campanha de boicote da Copa, mas de ceder ao apelo da minha consciência. Afinal de contas, não tenho sangue de barata.

O que, todavia, me dá esperança é saber que cada vítima deste sistema cruel é um mártir, uma testemunha chamada por Deus a depôr diante do tribunal de contas celestial. Assim como descrito no livro de Apocalipse, em breve, este sistema ruirá ante o peso do Cetro de Cristo e o amor e a justiça prevalecerão.

A última Copa que tivemos aqui foi em 1950. O Brasil se calou envergonhado diante do placar. Sessenta e quatro anos se passaram e espero que desta vez o Brasil não se cale, independente do placar, seja favorável ou não à seleção. Que tanto os jogadores quanto os torcedores demonstrem nos estádios e nas ruas que esta hemorragia ética precisa ser estancada antes que já não nos restem forças para torcer.

Quem sabe daqui a cinquenta ou sessenta anos sejamos novamente a sede da Copa do Mundo, e que tenhamos todas as razões para celebrar e não mais para nos corar de vergonha. E quando isso acontecer, que nosso mascote já não seja um tatu à procura de um buraco para se enfiar, mas algum outro animal exuberante de nossa tão rica fauna.

Comentários

Já fazem alguns dias que o autor publicou este texto em seu blogue, o qual repercutiu bem na internet. Apesar da Copa já ter começado, considerei que valeria a pena publicá-lo aqui na C.P.F.G.

Um ótimo final de semana a todos!
Unknown disse…
O que vimos foi uma abertura chimfrin tão fuleira quanto o fuleco. Uma galinha pintadinha cantando uma musiquinha ralé. ) que valeu a pena foi o desejo dos teocedores mandando a Dilma para o seu devido lugar. Mas a Seleção Brasileira de Futebol será campeã independente da vontade de Dilma. Elá não é técnica nem está escalada para jogar. Após aa copa vamos decidir para onde vai o PT com sua seleção de marginais.
Levi B. Santos disse…
É aqui no Brasil que talvez resida a maior comunidade japonesa do mundo. PERGUNTO: o que estava no coração do juiz japonês, quando deu aquele pênalty inexistente, quando o placar do Brasil (jogando mal)
contra a Croácia estava empatado em 1X1?
O juiz também estava nervoso e errou. Se errasse a favor da Croácia? A seleção brasileira não necessita das artimanhas argentinas. Foi tão bom que o único gol contra foi um brasileiro que fez. E pelo andar da carruagem a Croácia ganha México e Camarões. Nenhum deles tem futebol para ameaçar o Brasil. Estou assistindo o jogo. 1X0 México.
Acho que esses protestos com xingamentos e palavrões só mostram fragilidade dos manifestantes, uma tremenda falta de argumentos e de criatividade. Tudo bem que a democracia permite o baixo nível pois, afinal, faz parte da liberdade de expressão de cada um. Mas acho que há outras maneiras mais apropriadas e elegantes de um grupo de torcedores mostrar a indignação que sente.

Sobre a pergunta que o Levi fez, faço minhas indagações se os comentários da mídia cerca do jogo da seleção contra a Holanda, na Copa de na África de 2010, não teria influenciado o comportamento do árbitro. Se bem que o juiz não tinha decisivamente prejudicado o Brasil em tal ocasião. Ele apenas estava sendo alvo de uma superstição futebolística. Dessa vez, porém, o erro parece-me inequívoco pois não acho que o atacante do Flu tenha sido mesmo derrubado.
Também acho que a seleção brasileira tem qualidade superior a todos os adversários do grupo, mas precisa ficar atenta e não desprezar nenhuma equipe (lembremos da vergonhosa derrota que o Brasil teve num amistoso contra a fraca Suíça praticamente pouco tempo após ter vencido a Copa das Confederações no ano passado e também da derrota que a Espanha teve para esse time em sua estreia de 2010). Considero provável a nossa classificação em primeiro lugar no grupo, o que, provavelmente vai nos livrar de enfrentar logo a Holanda nas oitavas. Aliás, para passarmos pelos holandeses, ou mesmo pela Espanha, ou pela Alemanha, ou pela Azurra, temos que melhorar bem ajustante o talento dos excelentes jogadores da equipe do Felipão. No momento estou a assistir a vitória parcial do Equador sobre a Suíça por 1 a 0.